23 março 2013

Dia Mundial da Água: desafio é preservação de recursos hídricos

“O setor privado pôs olho grande, vendo a água como fonte de recursos e lucros”, diz Arnaldo Dutra sobre tentativas de privatização | Foto: Semae/Divulgação



Gilmar Eitelwein
Sul 21

A crise ambiental e o aquecimento global apresentam uma das mais graves ameaças à sobrevivência do homem no planeta. O esgotamento de fontes potáveis de água doce pelo consumo frenético e irresponsável aumenta o número de populações sem acesso à principal fonte da vida na terra. Os baixos índices de saneamento básico, a disputa pelo controle das fontes potáveis por grandes corporações, a maciça urbanização, as investidas predatórias do agrobusiness e, no âmbito internacional, tensões e até guerras – mais pelo controle da água do que por sua escassez – além de uma vasta e complicada legislação, acordos e tratados – todas essas questões tornam o tema complexo e exigem atenção de governos e sociedade. Há pelo menos 50 anos a gestão da água está na pauta e na agenda internacional. Neste 22 de março, quando se comemora o Dia Mundial da Água, as comemorações apontam para a ampliação das ações pedagógicas, mirando as futuras gerações em uma luta pela sustentabilidade.

Confira atividades relacionadas com o Dia Mundial da Água em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul


A água é um recurso abundante, mas finito. E o Brasil, um privilegiado nesta questão. Nosso País detém 12% de toda água doce potável do mundo, mas enfrenta problemas típicos de uma sociedade em desenvolvimento: altos índices de captação para irrigação e custos de tratamento, má distribuição, poluição das fontes e, principalmente, baixos índices de saneamento básico. A poluição de rios, lagos e oceanos e os altos índices de lixo orgânico e industrial que foram acumulando no decorrer das últimas décadas no fundo dos rios, à beira das matas e estradas e até na porta das casas, é resultado da ganância da indústria, do crescimento desordenado das cidades e da falta de educação de grande parcela da população. Felizmente, houve também um processo de conscientização ecológica a partir da organização desta mesma sociedade responsável pelo esgotamento do planeta, capaz de produzir uma massa crítica e provocar um processo de reversão. Talvez a tempo, talvez não.

Responsabilidades

Há mais ou menos 50 anos, o Rio Grande do Sul discutia as primeiras iniciativas legais para reduzir as agressões ao meio ambiente e preservar suas riquezas naturais. Pioneiro nas ações de sustentabilidade, o Estado vive situações paradoxais: é rico em bacias hidrográficas mas, a exemplo do que ocorre em grande parte do País, as fontes de águas abastecem grandes lavouras de arroz ou grandes indústrias, quando não chegam às grandes cidades altamente poluídas por dejetos humanos e industriais, o que eleva os custos de captação e tratamento para fornecimento à população. As alterações climáticas também têm sido frequentes, provocando estiagens e desabastecimento em vastas regiões da fronteira oeste e alcançando, inclusive, áreas abastecidas por represas e poços artesianos que retiram água do aquífero Guarani, na região norte, como é o caso de Erechim.

A seca de 2012, uma das piores do século, no Rio Grande do Sul, exigiu esforços das autoridades públicas no sentido de viabilizar obras de transposição, perfuração de poços, desassoreamento de barragens, entre outras medidas. No entanto, há muito para avançar na questão do abastecimento nas zonas rurais e a agricultura. Implementar atitudes responsáveis, evitar desperdícios e contribuir com a destinação correta dos resíduos é a contribuição que cada cidadão pode e deve dar nesta luta por um planeta mais limpo e habitável, entende o Presidente da Corsan, Arnaldo Dutra.

“Como poder público, devemos garantir políticas permanentes de investimentos e práticas sustentáveis. Como sociedade, é necessário defender que o controle da água não seja submetido aos interesses do capital. A gestão desse bem está diretamente relacionada ao exercício da cidadania e à sobrevivência da humanidade no planeta”, diz.
Um dos grandes desafios das autoridades públicas é garantir água de qualidade às regiões mais pobres e aos menos favorecidos. Neste sentido, a humanidade recebeu uma boa notícia: no primeiro semestre de 2012 o mundo alcançou, antes do prazo, a meta de reduzir pela metade a quantidade de pessoas sem acesso à água potável. O resultado foi divulgado pelo relatório Progressos sobre Água Potável e Saneamento 2012, publicado em parceria pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e UNICEF. Ampliar este número até 2015 era um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), traçado pelas Nações Unidas.

Controle

A pesquisa mostra que, na última década, mais de dois bilhões de pessoas conseguiram acesso a fontes de água potável. Ao final de 2010, 89% da população mundial, 6,1 bilhões de pessoas haviam alcançado este direito. Apesar dos índices positivos, 783 milhões ainda estão fora desta porcentagem. E, ainda mais alarmante, é a disparidade entre países e classes sociais. Na América Latina, 90% das pessoas têm acesso a fontes melhoradas de abastecimento de água, 31% a mais do que na África Subsaariana. “Não adianta comemorar 98% aqui enquanto o norte não tem. Precisamos aproximar e reduzir desigualdades”, reconhece Dutra.

O presidente da autarquia estatal, que atende 325 cidades gaúchas, sabe bem da disputa política e ideológica que é pano de fundo do debate sobre uma possível privatização da água e que teve seu auge, no Rio Grande do Sul, durante o governo de Yeda Crusius. Os defensores das teorias econômicas neoliberais, de máxima desregulação do mercado, saudaram a iniciativa. O Governo do Estado, em mãos do PSDB, incentivou a disputa. Findo o mesmo, já sob o comando de um governo de esquerda (Tarso Genro, do PT), mais voltado à valorização das instâncias públicas, a disputa arrefeceu. Apenas os municípios de Uruguaiana e São Gabriel conseguiram terceirizar seus serviços, retirando-os da alçada da Corsan.

O dirigente lembra da preocupação mundial sobre a questão da água como bem finito e do poder de quem detiver o controle sobre ela. E que os municípios gaúchos que resolveram privatizar seus serviços foram movidos por uma suposta deficiência na prestação dos serviços da estatal. O ‘case’ pode ser aplicado a qualquer cidade do mundo, incluindo países como França e Inglaterra que experimentaram esta privatização e viram o preço da água aumentar. “O setor privado pôs olho grande, vendo a água como fonte de recursos e lucros”, afirma. “Buscamos melhoria na qualidade do nosso serviço e uma aproximação com os prefeitos, mostramos que podíamos ser uma boa alternativa e ganhamos um grau de confiança que nos permitiu isolar essas duas situações”.

Saneamento

A capital gaúcha é resultado deste quadro. Aqui, no lago Guaíba, que serve de ponto de captação da água fornecida para milhares de residências, elas chegam poluídas dos rios Jacuí, Sinos e Gravataí. Somada às toneladas de lixo residencial despejadas pela população local, a captação e a limpeza da água em Porto Alegre torna-se um processo complexo e caro. Por isso, o Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) investe em educação ambiental e em saneamento, através do Programa Integrado Sócio Ambiental (PISA). O objetivo do programa, que iniciou em 2005 e deve encerrar este ano, é estender a rede de esgoto pluvial e cloacal da cidade, principalmente da zona sul, para despoluir as fontes. Quando estiver pronto, a capacidade de tratamento de esgotos da cidade, hoje em apenas 27%, deverá saltar para 80%, informa o Coordenador da Equipe de Educação Ambiental do departamento, Gustavo Falcão. “A separação do esgoto pluvial do cloacal evita que joguemos esgoto sem tratamento no Guaíba. Isto foi feito na bacia do Arroio Dilúvio e agora na Zona Sul”, explica Falcão.
Rio dos Sinos é uma das principais fontes de água potável para a população gaúcha | Foto: Semae/Divulgação


A administração municipal também tem trabalhado a educação para separação correta do lixo, evitando a contaminação dos arroios e do lago. Assim, quando a estação de tratamento da Serraria estiver pronta, 50% do esgoto da área central da capital, incluindo a ponta da Usina do Gasômetro, terá tratamento antes de ser despejado no Guaíba. A Zona Norte será atendida em seguida, com a construção de uma estação de tratamento próxima a Fiergs. Hoje, quem recebe este esgoto não tratado da região é o rio Gravataí. Encerrado o programa, é possível imaginar o Guaíba despoluído, a praia de Ipanema liberada para banhos e a captação de uma água muito mais limpa para consumo. A prefeitura trabalha com um Plano B, no futuro, que é captar água menos poluída do rio Jacuí.
Rio Grande do Sul precisa retomar protagonismo nas políticas de recursos hídricos

No comando da Agapan, Francisco Milanez alerta para a situação dos recursos hídricos no Rio Grande do Sul, principalmente após as mudanças aprovadas pelo Congresso Nacional no novo Código Florestal. Mudanças climáticas já estão gerando secas e falta de água em regiões que não imaginávamos – como Erechim – e regiões da fronteira oeste, no pampa gaúcho, vem sofrendo nos últimos anos com alterações climáticas.
“Há 20 anos duas importantes bacias hidrográficas, a do rio Santa Maria e do litoral norte, enfrentam falta de água”, alerta. A situação pode se ampliar. A bacia do Rio dos Sinos é frágil e enfrenta secas periódicas. Segundo ele, a reforma do Código Florestal reduziu drasticamente as perspectivas de recompor as áreas de proteção natural, como nascentes de rios, e aumentou as possibilidades de ocorrer erosão. “Nos próximos anos teremos mais secas, falta de águas e enchentes”, alerta.
Parece paradoxal, mas não é. O estado foi pioneiro nacional em termos de politicas de recursos hídricos – mas, segundo ele, hoje estamos atrasados. “A implantação da Política Nacional de Recursos Hídricos é muito lenta, falta decisão política e há grande pressão por parte de setor agrícola, do agronegócio”, reconhece. Segundo ele, as pessoas não querem que sejam regulamentadas as bacias hidrográficas porque não querem pagar pelo uso da água. “Mas é isto que vai garantir a água no futuro, senão vão pagar pelo próprio fracasso”, diz. Milanez entende que o novo Código Florestal reduz as áreas de proteção e que caminha a passos lentos a implementação das agências e a administração das bacias hidrográficas. Para um estado que iniciou a resistência à privatização da água, é preocupante.
“No fundo, quando todos tiverem que pagar pelo uso da água, teremos mecanismos e meios para uso mais racional para reduzir perdas e valorizar esse bem (a água)”, entende o Diretor do Departamento de Recursos Hídricos da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema), Marco Mendonça. Segundo ele, o grande eixo urbano e industrial da região metropolitana e serra, onde a produção industrial e o saneamento são fundamentais, sofrem esgotamento em função da escassez de recursos, caso da bacia dos rio dos Sinos.
Mendonça informa que o Rio Grande do Sul possui 25 bacias hidrográficas, e nelas foram criados 25 comitês de bacias. Mas a maioria está atrasada na elaboração de seus planos de bacias. Destas, três são especiais e enfrentam demanda excessiva, portanto não estão recebendo outorgas: Sinos, Gravataí e Santa Maria (na fronteira Oeste). A metade sul do RS tem um peso enorme da irrigação, principalmente do arroz. Responde por 90% da demanda de água captada dos rios em várzeas, enquanto no País este numero cai para 70%.

Há também, conflitos entre fornecimento de energia elétrica e turismo, em muitos municípios principalmente do norte do estado, na bacia do Rio Uruguai, em virtude de projetos de construção de barragens e hidrelétricas. A região norte convive também com bacias sobrecarregadas pela suinocultura. “Hoje cumprimos nossa função de órgão ambiental com dificuldades, é difícil fazer gestão da forma como foi estruturado todo o órgão. Precisamos investir em mais pessoal e equipamentos”, diz Mendonça, anunciando, para o futuro, monitoramento via satélites da situação dos recursos hídricos em convênio com a Agência Nacional das Águas (ANA) e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
O técnico lembra, também, do pioneirismo gaúcho na criação desta forma de gestão compartilhada entre sociedade e estado. “O Primeiro comitê de bacias criado no Brasil é o do Sinos, que acaba de fazer 25 anos”. O comitê do Gravataí foi o segundo. “Ainda temos este papel pioneiro de gestão compartilhada com a sociedade”, orgulha-se. Segundo ele, um dado determinante nas futuras políticas públicas é o investimento em armazenamento. Afinal, alterações e fenômenos climáticos obrigam a governos investirem na prevenção. “Temos que nos acostumar com feitos extremos, isto aconteceu no passado e vai continuar acontecendo”.

Fonte: Sul 21
http://www.sul21.com.br/jornal/2013/03/dia-mundial-da-agua-desafio-e-preservacao-de-recursos-hidricos/

19 março 2013

MANIFESTO DA AGAPAN NA AUDIÊNCIA PÚBLICA SOBRE PROJETO COPA 2014 E O CORTE DESENFREADO DE ÁRVORES EM PORTO ALEGRE

Quarto jovens no dia 6 de fevereiro subiram nas árvores para impedir obra da Copa 2014 que planeja derrubar 115 árvores no cartão-postal da cidade. (foto: Cintia Barenho/CEA) 

A seiva da Tipuana é vermelha como sangue. (foto: Cintia Barenho/CEA) 

1. O mínimo que desejamos para a nossa cidade é o melhor. Por esta razão, a AGAPAN não aceita o projeto da Prefeitura de Porto Alegre nos termos em que está proposto. QUEREMOS UMA MUDANÇA SUBSTANCIAL NO PRÓPRIO PROJETO, mas a PMPA até agora só admite compensações.
2. A PMPA decidiu derrubar 115 árvores para ampliação da Av. Edvaldo Pereira Paiva, no entorno da Usina do Gasômetro. Já foram suprimidas mais de uma dezena de magníficas árvores. Este número só não foi maior pela consciência de preservação da arborização urbana iniciada em 1975, com a subida do militante da AGAPAN, Carlos Dayrell, em árvores da AV. João Pessoa, gesto reeditado por jovens que também subiram nas árvores daquela avenida, impedindo que as mesmas fossem cortadas. Esta atitude expressa o quanto o sentimento de preservação ambiental da população de Porto Alegre, iniciado com a fundação da AGAPAN em 1971, consolidou-se ao logo destes 42 anos. Lastimamos, porém, que a visão do poder público municipal não tenha acompanhado o sentimento dos porto-alegrenses, que desejam suas árvores preservadas e não o alargamento de vias que atendam apenas aos carros e não aos anseios de seus habitantes.
3. Queremos o melhor para Porto Alegre. Por esta razão, é imperioso que a PMPA cumpra a legislação e apresente "o Estudo de alternativas locacionais e tecnológicas, para ser comparado, inclusive, com a alternativa zero". Enquanto não provar que o projeto proposto é a melhor alternativa para a cidade, a Prefeitura irá impor sua posição irracional e autoritária, não discutindo com a coletividade e acenando apenas com compensações.
4. Desde 1988 estamos sob nova Constituição, que obriga e valoriza a participação popular. Foi essa participação popular que, aprimorando o Plano Diretor vigente, criou o Parque do Gasômetro, sancionado pelo próprio prefeito José Fortunati. Parque este que inclui as Praças Brigadeiro Sampaio e Júlio Mesquita, a Usina do Gasômetro e sugere uma avenida subterrânea, para não cortar e comprometer o parque das pessoas. Ora, a Prefeitura tem que cumprir sua obrigação legal assumida, e não propor o alargamento dessa avenida! O Parque do Gasômetro, além de referência cultural e símbolo da cidade, é o ponto predileto dos porto-alegrenses matearem e assistirem o pôr do sol diariamente.
6. Portanto, a AGAPAN propõe que a PMPA tenha a grandeza de reconsiderar o projeto, contemplando alternativas e abandonando a intransigência técnica de considerá-lo uma opção única e inegociável, dando como contrapartida apenas compensações.
7. A AGAPAN, nos seus 42 anos de atuação pioneira, deu uma contribuição decisiva para a democratização do Brasil, a ecologização do imaginário porto-alegrense, gaúcho e brasileiro; para a criação da legislação ambiental e de instituições públicas encarregadas de implementarem uma política e uma administração ambiental. A própria Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Porto Alegre, a nossa SMAM, primeira secretaria municipal do meio ambiente a ser criada no Brasil, veio a existir graças à atuação da AGAPAN.
Os 70 km de Orla do Guaíba, menina dos olhos da especulação imobiliária e o mais valioso patrimônio público da coletividade porto-alegrense, não foram privatizados graças à vigilância e atuação política da sociedade civil organizada. Nenhuma sustentabilidade econômica e ecológica pode ser construída à revelia do que de melhor a ética e a racionalidade política produziram na cultura da humanidade. Não podemos aceitar, hoje, a vigência tão atual do diagnóstico feito há quase cem anos por Assis Brasil, um dos maiores gaúchos de todos os tempos, quando disse: “UM DESERTO DE HOMENS E IDEIAS”.
AGAPAN

18 março 2013

Por falar em corte de árvores em Porto Alegre

Está em fase final de elaboração  livro sobre o ambientalista Augusto Carneiro. Um trecho do livro, de divulgação oportuna neste momento:    

                             



 

Na cidade de Porto Alegre existe uma rua de fama internacional. Para visualizá-la, basta uma busca na internet, em português ou inglês, digitando as palavras “a rua mais bonita do mundo”. Aparecerá a rua Gonçalo de Carvalho, que conquistou sua fama não por abrigar algum tipo especial de concentração humana, não por nela existir  um viaduto de desenho futurista ou um exótico centro de compras. Por nada além do espetáculo proporcionado pelas copas das árvores que se erguem, triunfantes, em meio aos edifícios. Dela diz o site Treehuger: “independente do mérito do título, ela representa o que é possível quando os cidadãos trabalham juntos para honrar e proteger algo belo”.

        
Hoje convertida em patrimônio natural da cidade, a ditosa rua já conheceu tratamento bem menos carinhoso. De fato, a Gonçalo quase teve seu “túnel verde” substituído por via pavimentada, para facilitar o acesso de automóveis a um teatro que seria construído ao lado de um centro comercial.  Quando moradores e ativistas pela qualidade de vida desencadearam um movimento que acabou salvando as árvores, muitos porto-alegrenses manifestaram sua contrariedade na imprensa, quase sempre argumentando que se estava impedindo o progresso.      

Rua Gonçalo de Carvalho (foto: Cesar Cardi      

 - É triste, apesar de tantos anos de esclarecimento, sempre de novo aparecem os que acreditam que natureza e progresso são coisas incompatíveis, quando na verdade o desenvolvimento de um povo se mede por sua capacidade de evoluir sem destruir – dizia Augusto Carneiro, desolado, apoiado em sua bengala, ao observar os restos mortais de árvores abatidas próximo à Usina do Gasômetro, no início de fevereiro de 2013. A fim de permitir a ampliação de uma avenida, a prefeitura dera início ao plano de remover mais de uma centena de árvores, ação que foi interrompida por manifestantes. Em foto publicada por alguns jornais, um jovem aparece acomodado nos galhos de uma das ainda sobreviventes, ostentando um livro de José Lutzenberger.


            A imagem remete a outro evento, ocorrido em 1975, quando ativistas subiram em árvores na avenida João Pessoa para evitar que fossem derrubadas. Um ato arriscado naqueles tempos ditatoriais, mas vitorioso. O viaduto projetado para a avenida foi construído, mas modificou-se o seu traçado de forma que as árvores puderam permanecer. Essa harmonização foi absorvida pelo imaginário popular como um fato positivo. Transcorridas poucas décadas, a população se apropriou de espaços como o Parque da Redenção, o Parque Marinha e o Parque Maurício Sirotsky, referindo-se a eles com orgulho, já sem lembrar que por várias vezes estes locais e seu entorno estiveram ameaçados. Assim como a Gonçalo de Carvalho. O mesmo se aplica ao patrimônio histórico. O Mercado Público do centro da cidade, hoje um local que a maioria gosta de apresentar a visitantes, teria sido derrubado não fosse a intervenção de um punhado de ativistas.

          Ele acredita que os órgãos ambientais oficiais “são inefetivos porque eles têm pouca influência sobre outras secretarias e repartições, seus dirigentes são quase sempre escolhidos por conveniências partidárias de momento e não por terem real interesse e preparo técnico”. Isso explicaria também por que tais órgãos, em suas manifestações, costumam valorizar somente a beleza e a contribuição estética das árvores.

            - Arborização é muito mais do que isso – repete ele, exaltado. – As árvores das cidades cumprem funções importantíssimas para a qualidade de vida da população, retendo poluentes e melhorando o microclima, além de garantir a sobrevivência da fauna silvestre no meio urbano, especialmente as aves.

            Não só em Porto Alegre, esse tipo de dado tende a ser ignorado pelas municipalidades quando estão em jogo grandes obras, públicas ou privadas. Parecem ainda ter preferência os técnicos e urbanistas que, em suas intervenções, reservam à natureza, no máximo, um papel estético. São poucos os exemplos de obras que buscam desde o início a integração com a paisagem já existente. Remover vegetação parece estar quase sempre entre as primeiras opções, não entre as últimas.  Tanto é que os arquivos de Carneiro, da Agapan e das demais entidades ambientalistas registram um número impressionante de situações de confronto com administradores públicos por causa de árvores e parques.

            “Certas pessoas têm dificuldade em reunir e compreender as ideias que conduzem ao reconhecimento do valor intrínseco das áreas naturais, sua base filosófica, moral e biológica”, pensa Carneiro. “É essa dificuldade que está por trás das declarações de que haverá reposição das árvores derrubadas por causa de obras. A reposição quantitativa leva décadas para acontecer, quando as árvores do replantio alcançarem a idade das que se perderam. A reposição qualitativa  jamais acontecerá, pois aquele ambiente único, que integra as lembranças do povo, este se perde para sempre”.



   
(Do livro de memórias de Augusto Carneiro, em fase de conclusão, por Lilian Dreyer).



17 março 2013

Audiência Publica 18/ março: Vamos ter que ir embora uma tal SMAM quer nos despejar





A Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam) de Porto Alegre foi a primeira do país, criada em 1976, como resposta à vanguarda do pensamento ecológico iniciado com a fundação da Agapan em 1971.


É o órgão executivo responsável pela PROTEÇÃO do sistema natural e pelo controle da qualidade ambiental no município. 
Mas atualmente...

Audiência Pública sobre Obras da Copa na Av Edvaldo Pereira Paiva - Porto Alegre
dia 18 de março 
as 19 horas
Câmara de Vereadores de Porto Alegre


11 março 2013

12/Março Manifestação em Defesa dos Nossos Rios




Tendo em vista a aproximação do Dia Internacional de Luta contra o Impacto das Grandes Barragens (14/03), entidades e movimentos ambientalistas, incluindo grupos de estudantes, decidiram esta semana, em reunião realizada na sede do InGá, que realizarão uma manifestação em Defesa dos Nossos Rios e contra as barragens do PAC no Rio Grande do Sul. A atividade ocorrerá em frente do Palácio Piratini, no dia 12 de março (terça-feira) a partir das 13h30min.

O movimento pretende manifestar-se contestando as grandes barragens de irrigação e hidrelétricas que vêm causando inúmeros impactos ambientais, sendo seguidas de incontáveis irregularidades no licenciamento ambiental. Apesar disso, estas obras do PAC estão recebendo atenção especial dos governos federal e estadual para a instalação de um monitoramento articulado no RS, para seu “destravamento” e “aceleração”.
O evento aproveitará que a Ministra do Planejamento, Orçamento e Gestão, Miriam Belchior, vem à capital gaúcha para participar da reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES-RS), presidida pelo governador Tarso Genro, ocasião que divulgará aos conselheiros os investimentos federais das obras PAC no RS.

Os ambientalistas contestam, mais uma vez, a forma da elaboração dos projetos de infraestrutura, geralmente visando os interesses mais imediatistas de alguns setores econômicos, semelhante à maneira autoritária daqueles montados em pleno governo militar, na década de 70. Assim, não são levadas em consideração as características locais diferenciadas (sociobiodiversidade), com frequente atropelo tecnocrático e falta de diálogo com as comunidades, fomentados pela apologia pró-grandes obras, como ocorria no século passado. Essas, geralmente, carecem de estudos de viabilidade ambiental, recorrentemente trazem grandes impactos prejudiciais à natureza, às populações e ao erário público, pelo desvio e superfaturamento de recursos levado a cabo por grandes empreiteiras responsáveis pela construção de empreendimentos que recebem recursos públicos de programas considerados prioritários, como o PAC.

Cobram, em contraponto, o Monitoramento da situação socioambiental do Estado do RS e do Brasil, considerada calamitosa pelo setor ambientalista. Para isso, argumentam que os rios estão cada vez mais crivados de empreendimentos e que 2/3 das obras das hidrelétricas do PAC no Brasil estão sendo implementadas justamente em Áreas Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade (APCBio, MMA, 2007), ¼ em áreas caracterizadas no grau mais elevado – de Extrema Importância – com o deslocamento compulsório de mais de 150 mil pessoas, em parte povos indígenas, com desaparecimento de peixes nativos de piracema, importantes para os ribeirinhos, como o dourado, o surubim e o grumatã. Por outro lado, lembram também do comprometimento da qualidade da água, ar e solo pela agricultura empresarial brasileira de exportação, que consome enorme caudal de água e utiliza a maior quantidade de agrotóxicos de todo o Planeta, sem falar na consequência sobre os rios poluídos que agonizam, como o Sinos e o Gravataí, praticamente sem programas consistentes de reversão de suas situações críticas.

Entre as obras contestadas estão as megabarragens de irrigação do PAC Taquarembó e Jaguari, em pleno bioma Pampa, que receberam ações civis públicas por parte de entidades ambientalistas e ações judiciais e inquéritos por parte do Ministério Público, devido a inúmeras irregularidades. As duas barragens causarão o desmatamento conjunto de mais de 1.100 hectares de matas em galeria e outros milhares de hectares de campos nativos, destinadas a irrigar monoculturas (arroz, eucalipto, etc.) de algumas dezenas de grandes propriedades, com valores triplicados. Outra grande crítica dos ambientalistas é a forma de tratamento “fato consumado” do Complexo Binacional das Hidrelétricas Garabi-Panambi que, mesmo carecendo de estudos de viabilidade e de licenças ambientais, recebeu no final de 2012 um decreto do governador do Estado promovendo a criação de um Grupo de Trabalho e um Fórum Estadual de promoção da implementação destes projetos, incluindo o órgão ambiental que, além do Ibama, participa da emissão das licenças após os estudos ambientais (EIA-RIMA) ainda nem realizados.

O movimento ambientalista gaúcho vem, há anos, apelando para o diálogo com os governos, apesar das tentativas frustradas por promessas evasivas e forma dissimulada por parte de seus agentes. Entre os temas prioritários reivindicados para o debate estão o frequente desrespeito à legislação ambiental, a ausência de estudos de capacidade de suporte das bacias e dos ecossistemas fluviais frente ao conjunto crescente de barragens, e extinção de espécies, a proteção necessária das ACPBio (MMA, 2007), bem como uma discussão franca sobre os temas do chamado crescimento econômico e desenvolvimento, que respeitem as vocações locais e a biodiversidade. O que também é altamente preocupante aos ambientalistas é que essas obras são recheadas de recursos vultosos, e levadas a cabo por grandes empreiteiras (algumas concessionárias) financiadoras de milionárias campanhas eleitorais e que, ademais, recebem recursos facilitados do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), fato que depõe ainda mais contra o processo democrático.

Movimento Rio Uruguai Vivo, Apedema-RS, Mogdema, DAIB
AGAPAN 

03 março 2013

18/ Março: Audiência Pública: Debate ampliação da Av Edvaldo Pereira Paiva


...precisamos de muita GENTE nessa Audiência da Câmara!

Audiência Pública, com o objetivo de debater a ampliação da Av. Edvaldo Pereira Paiva, a realizar-se às 19 horas do dia 18 de março de 2013, no Plenário Otávio Rocha da Câmara Municipal de Porto Alegre, na Av. Loureiro da Silva, nº 255 nesta Capital.

Convide mais pessoas que não querem ver Porto Alegre cortando mais árvores.

Árvores exóticas e administradores nativos


Tipuanas na Praça Julio Mesquita e o corte de 18 árvores (de 118) para alargamento de avenida. (foto: cintia barenho/CEA)


Por Tiago Holzmann da Silva

O paisagismo é a disciplina que trata da organização do espaço aberto constituído por praças, parques, orlas, grandes avenidas. Ao contrário do que muitos imaginam, o paisagismo não se restringe apenas ao trato da vegetação, sendo que esta característica o diferencia da simples jardinagem. O responsável pelo projeto de paisagismo é o arquiteto e urbanista e sua atribuição permite que projete, além da vegetação, pavimentos e caminhos, equipamentos, mobiliário urbano, iluminação e infraestrutura. 
  
Porto Alegre é reconhecida como a capital mais arborizada do Brasil. O paisagismo de nossa cidade é muito diversificado apresentando um amplo conjunto de espécies inseridas em nossas ruas, praças e parques. Além das nativas paineiras, jacarandás, canafístulas, ipês e outras, também adotamos muitas espécies exóticas como plátano (América do Norte), cinamomo (Austrália), flamboyant (Madagascar), a washingtonia (México e Califórnia) palmeira dos canteiros de grandes avenidas como a Osvaldo Aranha e a Getulio Vargas, e espécies orientais de pequeno porte como a extremosa e o ligustro. 

A tipuana (Tipuana tipu), espécie cortada para a ampliação da via em frente ao Gasômetro, é uma espécie considerada nativa, de acordo com a bibliografia técnica, do cone sul da América, presente desde a Argentina até a Bolívia. A tipuana é uma das espécies mais utilizadas no paisagismo urbano em todo o mundo devido à características importantes como sua resistência, rápido crescimento, tronco retilíneo, facilidade de condução (podas), sombra farta e floração abundante. Em Porto Alegre, para dar apenas dois exemplos, são as tipuanas que oferecem sombra para o Bric da Redenção e também que configuram o túnel verde da Rua Gonçalo de Carvalho, a “rua mais linda do mundo”. 
  
A justificativa de que a tipuana é exótica e, por isto, merece ser cortada é falsa e está sendo utilizada para desviar o foco principal do debate. O que os administradores nativos precisam esclarecer é se o asfalto e os viadutos são uma prioridade sobre os parques e as praças, uma questão que, desde 1975, já parecia resolvida em Porto Alegre. E se, após uma discussão pública decente, a conclusão de nossos administradores nativos for preponderante, que se cortem as exóticas e também as nativas para que o asfalto e os viadutos possam garantir o direito de ir e vir dos veículos e o livre trânsito das máquinas. Esta é a verdadeira questão em discussão: quem tem prioridade os veículos ou as pessoas?


*Presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil / IAB-RS
Corte de árvore na avenida Ipiranga. (foto: cemiterio das árvores)

Arvores (240) na rua Anita Garibaldi ameaçadas por Obra da Copa 2014. (nessa/ Agapan)


Marcação de árvore marcada para morrer na Rua Anita Garibaldi pela Prefeitura de Porto Alegre. (nessa/ agapan).

http://iab-rs.blogspot.com.br/2013/02/artigo-arvores-exoticas-e.html

Carta da AGAPAN ao Dayrell: estamos esperançosos com a sensibilidade do Prefeito de Porto Alegre

Mobilização contra derrubada de árvores na Praça Julio Mesquita. Fev/2013


Caro Dayrell,


Com prazer imenso recebo tua carta que demonstra o quão acertada foi a honraria de cidadão honorário de Porto Alegre que te foi ofertada, visto que continuas conectado com esta terra que tanto te quer.

Agradeço tuas palavras, especialmente porque vêm de alguém que ama esta cidade, conhece e olha com o devido distanciamento que permite o equilíbrio.

Estamos de fato num momento difícil como aquele de 1975, com a diferença que agora numa democracia, não tão madura quanto gostaríamos, mas não tão injusta quanto aqueles dias.

Por outro lado, estamos num momento belo e cheio de oportunidades, pois estou esperançoso que o nosso prefeito tenha a sensibilidade de ver a grande oportunidade transformadora que se abre para todos nós de pensarmos e carinhosamente debatermos a cidade que desejamos e depois, unidos, nos dedicarmos a construí-la muito diferente daquela que os militares em 1974 projetaram e que ainda está sendo implementada, voltada a um meio de transporte falido e egoísta, como o automóvel.

Porto Alegre merece muito mais. A cidade que soube ser pioneira na luta por um mundo melhor e ambientalmente coerente merece um destino melhor. Por isto te agradeço o carinho da participação que certamente ajudará a criar este momento especial de mudança em nossa cidade em direção à construção de uma referência para as outras cidades também se encorajarem a construírem as suas.

Grande abraço saudoso ao amigo,

Francisco Milanez
AGAPAN

foto: jova fotografias