13 dezembro 2008

Movimento Defenda a Orla protocola carta ao prefeito de Porto Alegre, José Fogaça, solicitando que ele respeite às leis da cidade

Leia a íntegra da carta.

Excelentíssimo Senhor

Prefeito José Fogaça
NESTA CAPITAL

Ref.: Em defesa da normalidade jurídica no planejamento de Porto Alegre


Nós, participantes do Movimento em Defesa da Orla do Rio Guaíba, em
Porto Alegre, que travamos uma luta contra o projeto construtivo irregular da Ponta do Melo, chamado Pontal do Estaleiro, e sabedores de que outras obras de caráter polêmico e igualmente atentatórias à preservação do meio ambiente e à normalidade jurídica estão sendo propostas pelas instâncias públicas, vimos a sua presença, fazer algumas ponderações.

Em relação às demais obras previstas ao longo da orla de nosso rio, com
destaque para aquelas relativas aos estádios dos clubes Sport Club Internacional e Grêmio Futebol Porto Alegrense, só podemos enfatizar que elas propõem problemas já assinalados antes, no caso do Pontal, relativos à proteção contra as cheias, as marinas que avançam muito próximas aos canais de navegação, e, principalmente, o desrespeito com relação às áreas de preservação permanente.

Essas áreas são perfeitamente caracterizadas pela Lei 4771/1965, linha
mestra de toda a política ambiental do País. Essa Lei, em seu artigo Segundo, prevê que, ao longo dos cursos de água com mais de 600 metros de largura, a área de preservação permanente – APP – deva ser de 500 metros.

O parágrafo Único do Artigo Segundo da mesma Lei reza como segue: “No
caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observa-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989)”.

Por outro lado, a Resolução Conama Nº. 303, de 20 de março de 2002, que dispõe sobre parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente veio confirmar o estabelecido pela Lei 4771/65 citada anteriormente.

Pouco mais tarde, em 2004, o Congresso Nacional aprovou pela Lei 10.931
de 02 de agosto de 2004, no artigo 64, uma alteração a Lei 4771/65, ou seja, a exclusão das áreas urbanas da aplicação desta Lei, porém este artigo foi vetado conforme esclarecimento seguinte: "O art. 225 da Constituição da República impõe ao poder público o dever de defender o meio ambiente, aí incluído o dever de ‘definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos’ (§ 1o inciso III).
Também impõe especial proteção da Floresta Amazônica brasileira, da Mata Atlântica, da Serra do Mar, do Pantanal Mato-Grossense e da Zona Costeira (§ 4o do mesmo artigo)”.

Os contornos exatos dessa proteção são aqueles constantes da lei ordinária,
sendo constitucionalmente admissível alterar tal proteção de modo a torná-la mais ou menos rígida. No entanto, não é constitucionalmente admissível a simples supressão da norma de proteção ambiental, constante da Lei no 4.771, de 1965 – Código Florestal, em especial, referente às
áreas urbanas já existentes e também às áreas de futura expansão urbana.

Com efeito, o art. 64 do projeto de lei sob análise, estabelecia que qualquer
construção de imóvel em qualquer área que não seja totalmente afastada de zona urbana não se sujeita à Lei no 4.771, de 1965, fazendo às vezes de norma geral, aplicável a todas as pessoas, órgãos e instituições.

Considerando que a Lei no 4.771, de 1965 é um dos pilares da política ambiental do País, sendo, pois, um dos mais importantes instrumentos de gestão ambiental, ter-se-ia o afastamento de todas as condicionantes ambientais, relativas às construções, e por tal razão, a alteração foi vetada pela presidência da República.

Portanto a Lei 4771/1965 está em plena vigência, embora pareça ser
ignorada pelas instâncias públicas de nosso município.

Lei Orgânica de Porto Alegre

Chamamos oportunamente a atenção de V. Exª. para a circunstância de que
o STF tem determinado em decisões recentes que as obras dentro das faixas de proteção permanente sejam desmanchadas. Caso a Prefeitura autorize a construção de edificações em condições de ilegalidade, certamente terá que arcar com os ônus de custosas indenizações.

Achamos interessante citar alguns pontos dessa Lei, desde seu preâmbulo,
como segue: “O povo do Município de Porto Alegre, por seus representantes, reunidos em Câmara Constituinte, com os poderes outorgados pelas Constituições da República Federativa do Brasil e do Estado do Rio Grande do Sul, e o pensamento voltado para a construção de uma sociedade soberana, livre, igualitária e democrática, fundada nos princípios da justiça, do pleno exercício da cidadania, da ética, da moral e do trabalho, promulga, sob a invocação de Deus, esta LEI ORGÂNICA”.

Nessa Lei, destacamos alguns artigos que podem ser considerados diretrizes
básicas no que se refere à ocupação do solo urbano, aos direitos dos cidadãos e às obrigações do Poder Público.

Entre eles, citamos:
Art. 126 – Os interesses da iniciativa privada não podem sobrepor-se aos da coletividade.
Art. 147 – O Município deve promover, nos termos das Constituições Federal e Estadual, e da
Lei Orgânica, o direito à cidadania, à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, ao usufruto dos bens culturais, à segurança, à previdência social, à proteção da maternidade e da infância, à assistência aos desamparados, ao transporte, à habitação e ao meio ambiente equilibrado.
Art. 158 – O Município promoverá, em conjunto com a União e o Estado:
I – condições dignas de trabalho, saneamento, moradia, alimentação, educação, transporte e lazer;
II – respeito ao meio ambiente e controle da poluição ambiental;
Art. 241 – Os morros e matas existentes no âmbito do Município são patrimônio da cidade.
Art. 245 – Consideram-se de preservação permanente:
I – as nascentes e as faixas marginais de proteção de águas superficiais;
II – a cobertura vegetal que contribua para a resistência das encostas à erosão e a deslizamentos;
III – as áreas que abrigam exemplares raros, ameaçados de extinção ou insuficientemente conhecidos, da flora e da fauna, bem como aquelas que servem de local de pouso, abrigo ou reprodução de espécies migratórias;
IV – as áreas assim declaradas por lei;
V – margens do rio Guaíba;
VI – as ilhas do Delta do Jacuí pertencentes ao Município.
Parágrafo único – Nas áreas de preservação permanente não serão permitidas atividades que, de qualquer forma, contribuam para descaracterizar ou prejudicar seus atributos e funções essenciais.
Art. 246 – É vedado ao Município, a qualquer título, autorizar o funcionamento ou licenciar a instalação de indústrias ou atividades que poluam o rio Guaíba ou seus afluentes.

Os projetos denominados Gigante para Sempre, por exemplo, e Arena do
Grêmio, têm seu efeito impactante acrescido pelo fato de situar-se em Áreas de Preservação Permanente, que teriam seu regime alterado para adequar-se ao mesmo. Igualmente se passa com o projeto substituto do Estádio Olímpico, no bairro Azenha, indutor de um novo tipo de ocupação, que forçosamente impactará sobre o próprio bairro e seus moradores.

Outros projetos igualmente impactantes, previstos para o bairro Centro,
serão avaliados quando forem disponíveis dados mais precisos sobre o mesmo. Enfatizamos sempre, porém, que uma cidade não se define pela magnificência ou volume de suas construções, mas por seu caráter de comunidade humana solidária e detentora do poder de decidir de seu destino.
Hoje, a destruição ambiental em Porto Alegre, com abate da mata nativa, demolição de bairros inteiros, miscigenações construtivas inaceitáveis, retalhação de parques e praças, dá-se num ritmo alarmante, sem que algum poder público a coíba e discipline.

Porto Alegre, 11 de dezembro de 2008

Fórum Municipal de Entidades
O protocolo foi registrado sob número 20.883

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