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Charge: Santiago |
Para o mercado liderado por grandes grupos econômicos transnacionais e também parte da mídia conservadora, o processo de licenciamento ambiental é um mecanismo desnecessário que atrasa o crescimento econômico do País. Há uma forte pressão política e econômica para a flexibilização das licenças, com a clara finalidade de implementar empreendimentos industriais sem as devidas cautelas e exigências de preservação dos bens naturais.
As principais reclamações apontadas sobre o processo de licenciamento são a “demora injustificada” e a “burocracia excessiva”, ambas fundamentadas na problemática de restrição da competitividade das empresas. Vale ressaltar que há clareza quanto ao nível de exigências da legislação brasileira sobre o assunto, mas é preciso garantir os primados essenciais em termos de Direito Ambiental. Cabe registrar, no entanto, que a exigência do licenciamento surgiu nos Estados Unidos, ainda na década de 1970. Hoje, na União Europeia, é muito mais restritiva, se comparada à legislação brasileira.
O que acontece é que o licenciamento precisa respeitar o devido processo legal. Essa é a função dentro um processo administrativo para verificar quais os impactos a serem causados ao meio ambiente, bem como mensurá-los, permitindo ou não a proposta de instalação e operação de determinado empreendimento.
Por outro lado, os grandes grupos exercem uma forte pressão para aceitarmos qualquer empreendimento, independentemente dos custos sociais e ambientais produzidos por ele. Essa é a regra geral. Ou seja, parece que temos que recebê-los a qualquer preço, sob pena de ficarmos estagnados economicamente. Há um forte apelo econômico, com a suposta garantia de emprego e renda. Tudo é visto como ganho. Quando, na verdade, não é bem assim.
Na realidade, a apropriação do lucro é privada, individualizada e imediata, enquanto que os impactos sociais e ambientais são distribuídos à coletividade, no longo prazo. Empresas internacionais esgotam os bens naturais e exploram a natureza, e não podemos nem ao menos exigir as devidas compensações necessárias? Qual o receio de reprovar empreendimentos que causem danos irreversíveis ao patrimônio ecológico?
Pode ser um caldo do nosso complexo de vira-latas, como bem destacava o escritor Nelson Rodrigues, na medida em que não recusamos absolutamente nenhum investimento, seja ele qual for.
Investimentos são bem-vindos, mas não a qualquer custo social e ambiental. Nesse sentido, é importante destacar que desenvolvimento é diferente de crescimento econômico. Não são sinônimos!
Precisamos romper com essa cultura desenvolvimentista que apenas prejudica os nossos bens naturais sem as menores contrapartidas. Assim, o significado da palavra ‘desenvolvimento’ foi modificado, do sentido estrito e puramente econômico, para uma concepção ampliada. Dessa forma, o ‘crescimento’ é uma categoria contábil composta de purismos científicos. Vale lembrar que se pode perfeitamente ter crescimento econômico produzindo prisões e tanques de guerra, ou construindo escolas e investigando curas para o câncer.
Recorrentemente, a imprensa noticia que não atingimos os índices de crescimento econômico de países como a China, por exemplo. Mas será que é isso mesmo o que queremos? Devemos exigir um tipo de desenvolvimento que atenda às necessidades humanas, e não somente o acúmulo de capital, estagnando a melhoria da qualidade de vida.
E não estamos pregando o ecologismo radical, ou até mesmo a estagnação econômica (proposta considerada elitista por alguns).
Queremos apenas que se garanta o devido respeito às nossas riquezas naturais. Esse debate precisa ser feito, e de forma urgente. Antes que seja tarde demais.
Cristiano Lange dos Santos é advogado. Especialista e Mestre em Direito, foi Professor de Direito Constitucional. Atua como Procurador Jurídico do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS.
Marcelo Sgarbossa é advogado. Mestre em Análise de Políticas Públicas pela Universidade de Turim (Itália) e Doutorando em Direito pela UFRGS. Vereador em Porto Alegre (PT).
fonte: Sul 21
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