23 fevereiro 2014

Ingá questiona Ministério Público Estadual sobre a legalidade de decreto que promove realização do megaempreendimento do Complexo Hidrelétrico Garabi-Panambi

Complexo Hidrelétrico Garabi-Panambi. (foto: Radio Ijuí)
Ao Dr. Alexandre Saltz
Coordenação de Meio Ambiente do Ministério Público Estadual

Prezado Senhor:

O InGá vem encaminhar denúncia ao Ministério Público Estadual
questionando a legalidade do Decreto Estadual nº 50.017, de 9 de
janeiro de 2013, que criou um Grupo de Trabalho e um Fórum a fim de
promover a realização de um megaempreendimento de alto impacto
ambiental denominado Complexo Hidrelétrico Garabi-Panambi, na porção média do rio Uruguai, decreto que declara que a construção das
hidrelétricas Garabi e Panambi promoverá o desenvolvimento social e
econômico da região? a despeito deste(s) não possuir(em) nenhum
estudo de viabilidade ambiental e, como agravante, nenhuma licença
ambiental por parte do órgão de meio ambiente (IBAMA). Da mesma forma,
do ponto de vista da administração pública, é questionável que se
criem expectativas favoráveis na região e uma inevitável pressão sobre
os órgãos ambientais, implicando também em gastos públicos na promoção
de atividades que deveriam seguir todo o trâmite de viabilidade
ambiental, somente após um possível deferimento de licenças
ambientais, o que não é o caso, pelo menos no momento.

O Ingá também solicita ao Ministério Publico Estadual que atue em
conjunto com o Ministério Público Federal para que todo o processo de
promoção destes empreendimentos seja reavaliado, considerando os
elevados riscos à flora e à fauna do Rio Grande do Sul, em especial ao
Parque Estadual do Turvo, o Salto do Yucumã, levando-se em conta que
não se tem um balanço mínimo das condições de conservação da
biodiversidade na bacia, após dezenas de empreendimentos hidrelétricos
já realizados nas últimas duas décadas, bem como a diversas situações
de irregularidades já constatadas. Destacamos aqui o caso da UHE Barra
Grande, onde a própria empresa Engevix, que seria a principal empresa
brasileira que encabeçaria os estudos do Complexo Garabi, para a
Eletrobrás, estava envolvida no caso e foi multada por isso pelo Ibama
em 10 milhões de reais, em 2005.

Estamos profundamente preocupados com a ausência de iniciativas
públicas no sentido de que se assegure a necessária garantia legal da
conservação da sociobiodiversidade da região da Bacia Hidrográfica do
Rio Uruguai, tendo em vista os altíssimos riscos ambientais
decorrentes da maior área prevista para alagamento na bacia do rio
Uruguai (73 mil hectares) que seria provocada pelos projetos de
Aproveitamentos Hidrelétricos de Garabi e Panambi, levados a cabo pela
Eletrobrás e Ebisa (Argentina). Espécies como Dyckia brevifolia,
abundantes no Salto do Yucumã, até as décadas de 1980 (Brack et al.
1985) e 1990, hoje estão desaparecendo, como vimos constatando nos
últimos cinco anos e vamos pedir providências do MPE., bem como
averigue o desbarrancamento acentuado na mata ciliar após os
empreendimentos, a montante do P.Est. Turvo, das UHEs Foz de Chapecó,
Itá, Machadinho e Barra Grande.

Ressaltamos, do ponto de vista da biodiversidade, que entre os
principais impactos decorrentes destes novos empreendimentos
destacam-se a perda de áreas florestais do Parque Estadual do Turvo
(Decreto Estadual no 2.312, de 11 de março de 1947), o aumento do
risco de extinção de dezenas de espécies de flora e fauna incluídas
nos Decretos 42099 de 31 de dezembro de 2002 e 41.672, de 11 de junho
de 2002, no caso da onça (Panthera onca), por exemplo, bem como as
possíveis alterações sobre o Salto do Yucumã.

Causa estranheza à sociedade gaúcha que, apesar de não ser apresentada
a sequência do processo de AAI, o Governo do Estado tenha publicado o
referido Decreto, contrariando a necessária forma republicana de
gestão pública, pois o atropelo da medida, quando da criação do Grupo
de Trabalho e Fórum, acabou por gerar muitas expectativas políticas,
com setores econômicos, políticos e outros setores potenciais
apoiadores do empreendimento, circunstância que fortalece a sensação
geral de fato consumado em relação à realização destas obras.

Consideramos, ademais, que existe uma visível distorção do papel dos
órgãos públicos, já que o GT inclui até mesmo a presença da Secretaria
Estadual de Meio Ambiente, que teria como atribuição, justamente,
participar junto com o Ibama dos licenciamentos dos empreendimentos.
Qualquer processo de licenciamento deve prever também a possibilidade
de indeferimento pelos órgãos ambientais, situação esta bem provável,
pois do ponto de vista técnico, não se pode desconsiderar a situação
já crítica do rio Uruguai.

Outrossim, cabe assinalar que o Governo do Estado além de
desconsiderar a necessidade de término da Avaliação Ambiental
Integrada, prevista no TC de Barra Grande, está passando por cima do
Art. 9o da Política Nacional de Meio Ambiente (Lei no 6.938, de 31 de
agosto de 1981) que institui o Zoneamento Ecológico-Econômico,
instrumento público fundamental no planejamento não só de
empreendimentos e atividades, mas na gestão econômica e ambiental,
garantindo diretrizes claras de proteção da biodiversidade e dos
direitos da sociedade como um todo, visando as vocações econômicas
locais e sustentáveis dos elementos de suporte à vida biodiversa.

Porto Alegre, 21 de fevereiro de 2014

Atenciosamente,
Biól. Paulo Brack
Coordenador Geral do InGá

Ofício/InGá/nº03/2014 protocolado no MPE, no dia 21 de fevereiro de 2014

(grifo Agapan)

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