Houve pedido de
vista do processo que discute a legalidade da comercialização de sementes
transgênicas e o cultivo de variedades de milhos geneticamente modificados. A
ação civil pública foi levada a julgamento em sessão da 3ª Turma realizada hoje
(19/2) no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).
A ação foi ajuizada
pela ONG Assessoria em Projetos e Serviços a Projetos em Agricultura
Alternativa, pela Associação Nacional de Pequenos Agricultores, pelo Instituto
Brasileiro de Defesa do Consumidor e pela Terra Direitos contra as
empresas Monsanto do Brasil, Bayer e Syngenta Seeds, a Associação Brasileira
dos Produtores de Milho (Abramilho) e a União.
A ONG alega que o
artigo 2º da Resolução Normativa nº 4/2007 da Comissão Técnica de Segurança –
CTNBio, que dispõe sobre as distâncias mínimas entre cultivos comerciais de
milho geneticamente modificados, visando à coexistência entre os sistemas de
produção, é ilegal e ofende os direitos dos agricultores ao plantio e
comercialização de produtos não transgênicos. Para a autora, a norma é
insuficiente e não garante a coexistência das variedades orgânicas. Na ação,
requer que seja declarada a ilegalidade da resolução.
A relatora do
processo, desembargadora federal Marga Inge Barth Tessler, proferiu seu voto
negando provimento ao recurso. Conforme Marga, a prova disponibilizada nos
autos não é suficiente para o provimento da ação. “Não há uma sistematização
dos dados que permita a análise técnica dos estudos apresentados e os
resultados são ainda preliminares”, afirmou.
“É preciso aqui,
para a dimensão que esta Ação Civil Pública alcança, uma prova não acima de
qualquer dúvida, mas pelo menos acima de dúvida razoável. Esta prova não foi
produzida pelos autores. Há dúvidas e inconsistências na tese autoral. A
Resolução é certo, não é perfeita, poderia ser melhorada, mas no mínimo é um
critério razoável que não é de ser afastado sem prova firme e segura”, escreveu
em seu voto.
A desembargadora
concluiu seu voto dizendo que entende a preocupação da autora, mas que esta
deveria amparar melhor sua argumentação. “Não desconheço que o tema da
contaminação das lavouras por transgênicos é preocupante. Assim poderão, quiçá,
futuramente, em outra ação, se amparada em provas científicas e conclusivas,
virem as autoras a comprovar sua pretensão”, concluiu.
O pedido de vista
foi feito pela desembargadora federal Vivian Josete Pantaleão Caminha e o
desembargador federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz acompanhou a
relatora, negando provimento ao recurso. O novo julgamento ainda não tem data
marcada.
Fonte: Tribunal Regional Federal da 4a Região
Manifestação da Agapan:
Excelentíssimo (a) Sr. (a)
Desembargador (a),
Diante da inclusão da Apelação Cível
n° 50250884-11.2013.404.7000 na pauta de julgamento de hoje, 19 de
fevereiro de 2014, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan)
vem se manifestar para demonstrar o amplo alcance que os efeitos da decisão de
Vossas Excelências terá para a vida de milhares de agricultores e agricultoras
familiares e milhões de consumidores e consumidoras. Nos últimos anos foram
documentados inúmeros casos de contaminação transgênica que geraram danos
econômicos, ambientais, sociais e culturais. Não se trata, portanto, de uma
mera disputa de mercados, entre os produtores de sementes transgênicas e os
produtores de sementes não-transgênicas, mas sim de interesse público.
A criação de uma normativa mais
rigorosa por parte da CTNBIO, que garanta a coexistência de cultivos transgênicos
e não-transgênicos é condição essencial para que os e as agricultoras possam
optar pelo modelo de produção que considerem melhor, tanto do ponto de vista
econômico como também do social e ambiental. Porém, a Resolução Normativa nº 4
da CTNBio, como demonstrado nesta ação, não possui a eficácia a que se
propõe. Tanto é que a produção com sementes convencionais ou crioulas está
comprometida, tanto pelo custo adicional de se provar que não está contaminada,
quanto pela própria contaminação transgênica.
Outrossim, a utilização cada vez
maior de químicos (herbicidas, fungicidas, inseticidas entre outros) utilizados
para o desenvolvimento da semente transgênica, é expressivamente danosa ao meio
ambiente e à própria saúde humana. Desde 2008 o Brasil é o maior consumidor
desses químicos e isso se deve à sua inevitável aplicação na semente
transgênica, ambos vendidos em conjunto, formando o “pacote tecnológico”
oferecido aos produtores.
Vale lembrar que a grande
maioria dos alimentos transgênicos é destinada não à alimentação humana, mas à
produção de ração animal. Deste modo, tendo em vista que a agricultura familiar
é responsável pela produção de 70% dos alimentos consumidos no país, o aumento
do número de agricultores e agricultoras familiares que produzem alimentos
transgênicos resulta, na prática, em menos comida de qualidade na mesa do
brasileiro.
Mas é sobre as sementes crioulas,
patrimônio genético e cultural do povo brasileiro, que a contaminação
transgênica produz seus piores impactos. São crioulas as sementes não classificadas
cientificamente que resultam de processos de seleção e melhoramento realizados
pelas comunidades rurais ao longo dos anos. As sementes mais bem adaptadas são
armazenadas e repassadas de geração em geração. Com a contaminação transgênica
há o risco de que tais sementes se percam e, junto com elas, todo o
conhecimento acumulado ao longo de anos que possibilitou a sua
existência.
Sendo assim, diante do exposto e
tendo em vista que os padrões impostos pela Resolução Normativa n°4 da CTNBio
não são suficientes para impedir que ocorra contaminação, nós, da Associação
Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, solicitamos aos excelentíssimos
desembargadores que seja dado provimento à apelação e declarada nula a
Resolução Normativa n°4 da CTNBio.
Alfredo
Gui Ferreira
Presidente
Agapan
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