13 julho 2012

Cúpula dos Povos: uma avaliação ecopolítica.

 Imagens de área devastada na Amazonia.(Mario Tama/Getty Images)
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       Voluntários da  "Rio de Paz" com máscaras para denunciar o problema na fome dos países representados por bandeiras e pratos. (Reuters/Ueslei Marcelino)
 Vigília noturna na Rio +20. (Reuters/Ana Carolina Fernandes)
                                       Dança tribal da tribo Guarani Iandewa na Vila Kari-Oca .(AP Photo/Felipe Dana)
 Incendio ilegal de mata na Amazonia. (Mario Tama/Getty Images)
                                         Centenas de pessoas fazendo ação para mais atenção aos Rios.
                                            (AP Photo/Amazon Watch)

Introdução
foto: (Reuters/Siemens)
 
A delegação da AGAPAN que participou da Cúpula dos Povos no contexto da Rio + 20 elaborou a presente avaliação geral do evento para que seja partilhada e aperfeiçoada com as contribuições dos demais ecologistas gaúchos que lá estiveram. A avaliação é coletiva, por um grupo de pessoas da Agapan, visa analisar a multiplicidade e a complexidade de tudo o que aconteceu na Cúpula dos Povos. A pluralidade e a riqueza dos contatos e comunicações excederam as capacidades individuais e grupais de assimilação,impondo limites às possibilidades de sintetizar e de avaliar numerosos aspectos de toda a complexidade informacional que por lá circulou. 

No entanto, cada um de nós teve uma experiência cognitiva pessoal, compartilhada e sintetizada na percepção política da nossa delegação.Com consequência, o documento é uma descrição contextualizadora e uma avaliação ecopolíticada Cúpula dos Povos, sem a pretensão de ser uma análise definitiva do evento. Salientamos que, além da nossa participação na Cúpula dos Povos, a reunião de avaliação foi fundamental para constatar que a AGAPAN oferece aqui subsídios críticos a serem considerados para o estabelecimento de diretrizes e encaminhamentos políticos, que conduzirão a atuação no movimento ecológico nos próximos anos.

Um novo mundo não apenas possível, mas acontecendo

(Mario Tama/Getty Images) Belo Monte 
 
A tomada de consciência da crisecivilizatória instaurada pelo movimento ecológico constitui a matriz de complexidade cultural e política de um novo projeto de civilização. A gestação dessa matriz é um desafio sem precedentes, que abrange todos os aspectos da cultura e das instituições sociais que a humanidade criou ao longo da sua história. Contrapondo-se à inexistência de um consenso político no âmbito dos interesses econômicos e dos estados nacionais, causador do retumbante fracasso da Rio+20governamental, avariedade e a riqueza de eventos simultâneos ocorridas na Cúpula dos Povos expressou um consenso à altura deste desafio.
O que lá foi mostrado evidencia que, sem visibilidade na mídia, sem alarde e dispensando favores estatais, uma massa crítica de iniciativasestá levando adiante experimentos ecossociais deum novo paradigma político em numerosos lugares do mundo.Diante do sentimento de frustração que tem acompanhado o retrocesso legal e a inércia institucional dos governos, entre nós e no mundo desde a Eco´92, o contato com esta realidade foi extremamente estimulante para a delegação da AGAPAN.

Diante da gravidade e da intensificação da crise ecológica, os 41 anos de atuaçãoda nossa entidade,priorizando políticas públicas e em confronto permanente com órgãos governamentais e a legislação ambiental que, paradoxalmente,opróprio pioneirismo da AGAPAN ajudou a criar, atualmente apresentam um saldo deprimente e desanimador. Assim tem sido a nossa participação minoritária em conselhos, comitês e comissões, por exemplo, onde somos sistematicamente derrotados nas votações.Esta constatação obriga a nossa entidade a reavaliar essa participação legitimadora, visando mudar essa situação perversa e deprimente para investir em atividades com maior retorno. Neste contexto, a Cúpula dos Povos nos proporcionou uma amostragem significativa do somatório de experiências da sociedade civil. A participação neste evento possibilitou contatos diretos com pessoas, organizações, ideias e realizações em todo o mundo. Essa riqueza de informação e de trocas humanas ampliou nossos horizontes, renovou nossas esperanças, fortaleceuos laços de solidariedade e revigorou a dimensão planetária e dignificante do movimento ecológico como um novo paradigma político da humanidade.


Ativistas ambientais marcham durante a Rio +20 contra o Codigo Florestal e contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no centro do Rio de Janeiro, no dia 18 de Junho de 2012.
(Antonio Scorza/AFP/Getty Images)
A Marcha dos Povos
A Marcha dos Povos em Defesa do Planeta e da Humanidade aconteceu na tarde do dia 20 de junho e teve cerca de 80 mil participantes, apesar da grande mídianoticiarque foram 20 mil pessoas. Havia uma imensa bandeira do Brasil da largura da avenida Rio Branco. Mulheres africanas dançavam e cantavam, dando um espetáculo maravilhoso de cultura e beleza. Era gente e mais gente! Foi uma festa intercultural, uma gigantesca demonstração coletiva de vitalidade e de força dos ecologistas e de outros movimentos sociais do Brasil e do mundo. No desfile, o Governo brasileiro foi criticado com humor e criatividade. Destacou-se um grande boneco representando a presidenta Dilma Rousseff, caracterizada como um Tio Sam na clássica posição de dedo em riste, vestido de verde-e-amarelo e com a bandeira dos Estados Unidos embaixo... E uma grande montagem fotográfica mostrava a nossa presidenta, quando ainda era uma jovem guerrilheira, armada com uma motosserra nas costas, ao invés de uma metralhadora...

Rio+20 - Cúpula dos Povos: a avaliação
                                                                 
A avaliação final da Cúpula dos Povos realizou-se na Tenda Vascocelos Sobrinho, na manhã do sábado dia 23 de junho, na plenária da FBOMS (Fórum Brasileiro de ONGS e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento). Inicialmente foi historiada e comentada a preparação da Rio+20 e, a seguir, avaliada a Cúpula dosPovos.

O governo brasileiro perdeu uma oportunidade única de afirmar a soberania do país e de protagonizar o evento, afirmando sua importância ecológica e política, como país detentor da maior biodiversidade do Planeta. Mas o que protagonizou foi uma visão desenvolvimentista medíocre, defasada e retrógrada. O fracasso daRio+20 levou nosso país asofrer um desgaste. A retirada das assinaturas das organizações ambientalistas em apoio ao documento oficial da Rio+20 foi acompanhada pelos  representantes dos setores econômicos e empresariais, caracterizando o fracasso da Rio+20.

Em concordância com as nossas previsões sobre o fracasso do evento, baseadas no fato de que os governos nacionais não cumpriram com os compromissos assumidos na Rio-92, não poderiam apresentar propostas à altura da “Crise Ecológica Civilizacional”.  Consideramos que os documentos governamentais não podem ser produzidos magicamente na véspera de um evento, pois exigem amplas e complexas negociações, que requerem grandes prazos. 


Tendas autogestionadas: o que ofereço e procuro

A seguir, na avaliação da Cúpula dos Povos,falou-se sobre o sucesso das atividades autogestionadas, realizadas nas tendas, através de numerosas propostas temáticas e métodos de trabalho: oficinas, rituais, celebrações, conferências, debates, depoimentos, mesas redondas, filmes, música, danças, representações, sensibilização, contatos, relatos, trocas de experiências, ampla distribuição de material impresso, etc.   
A natureza não-convencional e criativa dessas atividades de comunicação, conscientização e aprendizagem divulga e informa numerosas experiências ecossociaisbem sucedidas do paradigma ecológico no Brasil e no mundo. As tendas da Cúpula dos Povos promoveram uma pedagogia participativa, exercida por pessoas e instituições que mostram e expressam realizações concretas e inquestionáveis. A atmosfera alegre, afirmativa e propositiva das tendas contrastou radicalmente com o clima de tensão e conflito que caracteriza o cotidiano do ambientalismo político, em confronto permanente com o estado, as instituições e a ordem social existente na nossa civilização.  A diversidade das atividades autogestionadas foi o pontoalto da Cúpula dos Povos, responsável pelo sucesso que compensou largamente as deficiências, jogos de poder e conflitos do evento.


Muito além da festa
Ficou evidenciado o gigantesco trabalho que teremos que fazer para ampliar, nos demais setores da sociedade civil, uma visão ambiental mais ampla e madura, já que, ao participarem, demonstraram profundo interesse pela causa.
Portanto, talvez seja o caso de pensarmos em outras periodicidades e em espaços próprios para expressar o movimento ecológico na sua plenitude e legitimidade.Na atual conjuntura hegemônico-financeira é indispensável que o movimento ecológico contraponha uma ordem à desordem vigente. Conseguimos rechaçar a continuação do caos proposta pela insustentabilidade da dita “economia verde”, endossada pelo manto legitimador da ONU, como equacionamento da crise ecológica. Mas o momento exige o processo de construção de uma agenda unitária para contrapor à dispersão dos movimentos sociais e à administração midiática desmobilizadora da opinião pública.
Somente uma autoorganizaçãoda sociedade partindo do âmbito local, a começar em nosso país,direcionando os movimentos sociaispara o questionamento e a redefinição do papel do estado no atual impasse civilizatório da crise ecológica, terá condições de estabelecer uma agenda pautada na luta contra a violação dos direitos humanos e ambientais.  Caso este encaminhamento não aconteça, os poderes instituídos continuarão processando judicialmente, prendendo, perseguindo e matando impunemente pessoas insatisfeitas e revoltadas com a ordem social existente,diante de uma coletividade passiva, impotente e desunida, em plena democracia formal burguesa.

O fracasso deles e o nosso sucesso

Contrastando com o fracasso da Rio+20, a Cúpula dos Povos foi o local privilegiado para a expressão de um consenso, onde a troca de ideias, encontros e debates sobre os diversos temas ambientais e sociais oportunizaram a retomada de uma agenda ecológica planetária comum, promovendo a visão de um horizonte de articulação e ampliaçãodaslutas futuras.


Comitiva da AGAPAN - Cúpula dos Povos, Rio de Janeiro, junho de 2012.
AGAPAN/ JULHO DE 2012.
Imagens: site envolverde; site Reuters.

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