O regimento interno da Câmara de Vereadores de Porto Alegre autoriza a votação de projetos em regime de urgência, para atender a situações críticas excepcionais. A votação do Pontal do Estaleiro em regime de urgência foi um procedimento bárbaro em termos éticos, políticos e jurídicos. Ao dar este encaminhamento açodado a uma decisão irreversível, a exigir um profundo embasamento científico, técnico e político, a Câmara de Vereadores, leviana e irresponsavelmente, descumpriu todos os procedimentos que asseguram a racionalidade e a transparência do seu funcionamento institucional. Ao fazê-lo, elevou um mero dispositivo regimental acima da Constituição Federal, da Constituição Estadual, do Código Estadual do Meio Ambiente, das Leis Orgânicas Municipais, do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental, do Estatuto das Cidades, das Comissões da própria Câmara, enfim, acima da própria ordem democrática.
No decorrer daquela sessão plenária histórica, as ameaças, intimidações, palavrões e o primarismo da argumentação dos edís favoráveis ao Pontal ofereceram um espetáculo degradante e vergonhoso.
Nos momentos finais da votação os representantes da especulação imobiliária e da construção civil, ordenavam em voz alta aos vereadores as emendas a serem aprovadas ou rejeitadas. E os vereadores deliberavam entre si e obedeciam.
O que os ecologistas, estudantes e lideranças comunitárias testemunharam foi o uso ilegal, ilegítimo, imoral e predatório da soberania do poder legislativo municipal, exercida abusivamente por uma composição majoritária de vereadores. Foi mais um crime patrimonial e ambiental contra a cidade. O que estamos vendo e denunciando é o desempenho exemplarmente perverso desta instituição. Portanto é a hora de se colocar a Câmara dos Vereadores no banco dos réus e reafirmar a autonomia dos três poderes, princípio basilar da democracia.
O Poder Judiciário deve cumprir o seu papel institucional na constituição da nossa ordem democrática. Porto Alegre não merece a Câmara que tem. É hora de acabar com esta indigência política. O Brasil e o mundo estão necessitando desta lição exemplar. Pois para o nosso consenso democrático mais moderno e esclarecido, formado pelo pioneirismo ecológico mundial da nossa cidade, não pode haver sustentabilidade sem democracia.
Celso Marques – ex-presidente e conselheiro da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural
Um comentário:
Alô pessoal;
Embora a 500km de distância do olho do furacão, pois moro em Floripa, mas na condição de cidadão do planeta, somo-me às palavras indignadas do companheiro de lutas e amigo Celso Marques.
Vivi os piores, e também alguns dos melhores, momentos da minha vida política ao cumprir meu mandato de vereador entre 1989 e 1992. Na defesa intransigente que fiz das bandeiras ecológicas, que mantenho até hoje, me deparei à época, com um quadro vergonhoso que, parece, não mudou qualitativamente de lá para cá.
O esquema de compra de votos obedece ao conhecido "modus operandi" de quadrilheiros, tal qual máfias na defesa de interesses do grande capital. Se articulam por dentro do sistema de poder, e contra as quais, só podemos recorrer aos meios judiciais e policiais, além do protesto usual que sempre fazemos. Como vêem, isso não tem bastado.
Portanto, o chamamento que o Celso faz para a intervenção do judiciário no processo é mais que pertinente e necessário. Nós, como cidadãos não temos os meios a nossa disposição para investigar a bandalheira por trás dessas votações que consagram privilégios para minorias e derrotam o interesse público. Deixo aqui a opinião, calcada em minha própria experiência que vivi na Câmara de Vereadores de PoA, que o movimento em defesa do Guaíba provoque o engajamento das promotorias públicas que tem o dever de intervir nessas situações. Afinal, pagas por nós para defender o interesse público, e não o privado.
Saudações ecológicas,
Gert Schinke
Postar um comentário