Declaração da vice-presidenta da Agapan, Sandra Jussara Ribeiro, durante a Audiência do Pontal do Estaleiro, POA, 06/08/2008.
A Lei Orgânica do Município de Porto Alegre, artigo 245, incisos I e V, ao identificar a Orla do Guaíba como área de preservação permanente, estabelece tratamento especialíssimo às áreas e imóveis nela localizados. Com efeito, o parágrafo único deste artigo veda, em tais áreas, atividades que de qualquer forma, contribuam para descaracterizar ou prejudicar seus atributos e funções essenciais.
No entanto, o projeto que hoje se debate altera radicalmente esta área, e o pior, sem que tenha sido apresentado o respectivo Estudo de Impacto Ambiental. Se em qualquer outro local a exigência de tais estudos para empreendimentos de impacto é rotineira, neste caso tal exigência deve ser considerada requisito essencial para o exame de qualquer projeto de lei que trate da sua urbanização.
Além disso, ainda a lei orgânica de nossa cidade estabelece no artigo 126: “Os interesses da iniciativa privada não podem se sobrepor aos interesses da coletividade”. Por sua vez, o artigo 127 deixa claro que, “os planos que expressam a política de desenvolvimento econômico do município terão o objetivo de promover a melhoria da qualidade de vida da população, etc...”.
Não é o nosso caso.
A Lei Complementar 470/2002, que diga-se de passagem é uma aberração, teve sua modificação elaborada no Executivo, e não foi encaminhada pelo Sr. Prefeito para a sua efetivação à Câmara Municipal. Porém, este projeto aqui chegou por outros caminhos. Este é o assunto que deve ser discutido hoje, aqui. Tudo o que se vê, tudo o que se sabe da advocação da proposta do empreendimento para a Ponta do Melo é especulação. A proposta que se tem conhecimento é mais um recurso de marketing, para viabilizar o interesse comercial, com construção de seis torres de 14 andares que poderia até, ser viável em outro local, que não Orla.
Vamos esclarecer de uma vez por todas!!! A Orla, onde é previsto o tal empreendimento, também é Área Especial de Interesse Cultural. Estamos diante de uma agressão tanto dos empreendedores, como do Poder Público, e esta Câmara, na eventualidade de aprovar este projeto, também assumirá esta responsabilidade. E isto para viabilizar interesses esconômicos, sobrepujando os interesses ambientais e deformando a Orla, retirando sua função mais do que centenária.
Não se sabe e não está em discussão o que esta proposta trará de impacto ao entorno, repita-se. Fala-se muito, mas o resultado é imprevisível.
Sustentamos então, que a Orla deve ser respeitada como patrimônio natural, paisagístico, cultural e histórico da comunidade portoalegrense. Além do mais, a Orla no seu exame para revitalização não deve ser encarada isoladamente e devemos respeitá-la com a noção adequada de revitalização com parques, jardins, equipamentos de lazer como espaço aberto para uso de toda a população. Falamos insistentemente nisso, e o Poder Público, os empreendedores e uma parcela da população do bairro Cristal, desconsideram isso.
Os outros empreendimentos próximos executados e em andamento, já configuram um problema de circulação nas vias públicas para quem se direciona à Zona Sul, não há alargamento de pistas que solucione este problema. Para se ter clareza de que as obras que estão sendo realizadas dão suporte ao empreendimento, seria necessária a realizada de mais um estudo: o Estudo de Impacto de Vizinhança, o qual não foi sequer previsto.
A proposta beneficia uns poucos privilegiados que terão condições financeiras de ocupar o espaço em questão, mesmo que se proponha áreas abertas de uso público, junto ao proposto empreendimento, estas com certeza, não serão ocupadas pela comunidade portoalegrense como um todo, pois o empreendimento privado, acaba se apropriando do espaço, promovendo desta forma segregação social.
Quando o terreno foi adquirido, se conhecia suas limitações de edificações e atividades, portanto é inadmissível a alteração da lei para benefeciar o empreendedor e uma pequena parcela da população, prejudicando nossa cidade. Siga-se o exemplo da urbanização que foi feita ao longo do tempo desde a Usina do Gasômetro até a Ponta do Melo. Hoje não se pode mais dizar que a cidade está de costas para o Guaíba. Ela usufrui diariamente em suas caminhadas, em suas rodas de mate e bicicletas.
Se por acaso a sociedade for mais uma vez descartada pela sua não participação em todos os atos do planejamento urbano, como expressa o Estatuto da Cidade, vamos deixar para as próximas gerações um exemplo de prepotência contra o interesse público.
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