21 junho 2010

Projeto de venda do Morro Santa Tereza volta à pauta no próximo dia 22

Em Porto Alegre, Assembleia Legislativa pode retirar urgência do polêmico PL 388. Movimentos ambiental e de moradores mantêm campanha em defesa do Morro



É grande a pressão sobre os deputados gaúchos para a retirada do regime de urgência do PL 388/09, que propõe a venda de 74 hectares do Morro Santa Tereza, em Porto Alegre. Diversas entidades se manifestam a favor da ampliação do debate, principalmente pela desproporcional valorização da área e falta de detalhamento técnico, argumentos que a cada dia demonstram a necessidade de cautela, num momento pré-eleitoral e em que as atenções se voltam para a Copa do Mundo. No último dia 16, a morte do ex-deputado Bernardo de Souza fez com que a sessão da Comissão de Constituição e Justiça fosse adiada, onde o projeto está sendo apreciado. Assim, o debate será retomado na próxima terça-feira (22).

Para o deputado Raul Pont (PT), “a tese da urgência é uma falácia”. Isso porque, conforme anunciado pelo Governo do Estado, o vencedor da licitação terá um prazo de cinco anos para construir as nove novas instalações da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) em áreas da periferia de Porto Alegre e no interior do Estado. “O Executivo teve três anos e meio para apresentar o projeto e agora pede que a Assembleia o aprecie em 30 dias”, critica Pont.

“O argumento da falta de recursos orçamentários não se sustenta”, afirma Ponto, ao lembrar que, no final de dezembro de 2009, “a Assembleia, por maioria, liberou para o Executivo quase R$ 1 bilhão do Fundo de Previdência (resultado da venda das ações preferenciais do Banrisul) para uso de investimentos”. Já em maio passado, a Assembleia autorizou o Governo a buscar recursos no BNDES na ordem de R$ 150 milhões. “Dinheiro não falta e sua falta não se justifica”, destaca Pont.


Ausência de proteções

Além de deputados, entidades sindicais e movimentos populares também questionam o projeto, “que negocia apenas a venda da área. Não existe um projeto para a Fase, não existe proposta de regularização das moradias e não há garantia para as áreas de proteção e os prédios históricos”, destaca o diretor do Semapi, Paulo Mendes Filho.

Para o representante do Semapi, a ausência de avaliação de preço mínimo, entre o patrimônio a ser alienado ao objeto que se destina, torna o projeto ainda mais questionável. “O Governo tem uma avaliação do imóvel por R$ 89 milhões, valor que, conforme engenheiros especialistas, está muito abaixo do mercado e das oportunidades de negócio que o cercam”, observa Mendes, ao comparar que, enquanto o valor do hectare no Morro Santa Tereza está sendo negociado a quase R$ 1 milhão, na área do Estádio dos Eucaliptos, do Internacional, localizado na parte baixa do bairro, cada hectare é avaliado a R$ 10 milhões.

“A área é nobre, com vista maravilhosa, mata nativa e prédios históricos, e poderá ser valorizada, abrigando condomínios privados”, alerta o presidente do Sindicato dos Engenheiros do RS, José Luiz Azambuja. “Atualmente, não há índices construtivos definidos para aquela área, até porque os 74 hectares são públicos, mas, após a venda, isso poderá mudar”, antecipa, ao analisar não entender a pressa de venda de um patrimônio tão valioso, para uma implantação prevista em cinco anos, mesmo com a existência de recursos do Governo Federal para a reestruturação da Fase, “exigida e necessária”. Pelo baixo valor de avaliação atribuído à área, o Senge ofereceu análise de especialistas, os quais indicam que o terreno pode ser melhor avaliado.


Posses em tramitação

Outro grave problema do projeto é ignorar a ação que tramita no Ministério Público de reconhecimento de posse de mais de 1,5 mil famílias que, há décadas, ocupam parcialmente uma área do Morro, em especial nas vilas Ecológica, Gaúcha e Santa Tereza, com o direito de uso garantido pela Medida Provisória nº 2.220, de 4/09/2001, que regulamentou as disposições do art. 183 parágrafo 1º da Constituição Federal. “Essa MP está em plena vigência, garantida pela Emenda Constitucional nº 32/2001. Ou seja, aquelas comunidades já têm direito à moradia naquele local com urbanização e, portanto, a área não pode ser vendida, pois não é de domínio exclusivo do Estado”, salienta a vereadora de Porto Alegre, Sofia Cavedon (PT), que acompanha o processo.

De acordo com o texto da minuta de retirada de urgência apresentado pelo Ministério Público, “pela legislação nacional, os ocupantes têm direito de permanecerem no local. Além disso, a Constituição gaúcha prevê que as áreas do Estado que se encontrem subutilizadas ou não utilizadas sejam destinadas para a habitação”. Segundo o desembargador Júlio Almeida, coordenador de meio ambiente do MP, “se a área da Fase encontra-se nessas condições, tanto que o Governo pretende aliená-la, deveria ser destinada a assentamento de população de baixa renda”.

O Ministério Público é uma das entidades que se manifestou a favor da retirada do regime de urgência do PL 388, assim como o Tribunal de Justiça do RS, Ministério Público do RS (Promotoria de Justiça de Habitação e Defesa da Ordem Urbanística), Defensoria Pública do Rio Grande do Sul (Núcleo de Regularização Fundiária), Câmara de Vereadores de Porto Alegre (por unanimidade), Semapi/RS, Sindicato dos Engenheiros do RS (Senge/RS), Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Rio Grande do Sul (Crea/RS) e Encontro Gaúcho de Estudantes de Direito (Eged), com apoio de ONGs ambientais via Apedema (Associação Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente), que mantém manifestações e o abaixo assinado eletrônico O Morro é Nosso, que pode ser acessado pelo http://www.abaixoassinado.org/abaixoassinados/6198.

Por Adriane Bertoglio Rodrigues - AGAPAN
Especial para EcoAgência de Notícias EcoAgência

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